terça-feira, outubro 18, 2011

Inconstitucionalidade da responsabilidade subsidiária na aplicação de coimas

ACÓRDÃO N.º 24/2011

Processo n.º 551/10

2.ª Secção

Relator: Conselheiro João Cura Mariano

Acordam, na 2.ª Secção, do Tribunal Constitucional

Relatório

A. veio deduzir reclamação judicial, nos termos dos artigos 276.º e 278.º, n.º 3, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Feira I, no processo de execução fiscal nº 3441200701002295 e apensos, de 22 de Fevereiro de 2010, que indeferiu requerimento apresentado pela reclamante opondo-se à reversão contra si efectuada nesse processo.

Foi proferida sentença em 21 de Abril de 2010 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a reclamação e julgou extinta a execução contra a reclamante quanto à divida proveniente de coima e de encargos de contra-ordenação, com fundamento na desaplicação, por inconstitucionalidade, do disposto no artigo 8.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, quando interpretado com o sentido de que aí se consagra uma responsabilização subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora.

O Ministério Público recorreu desta sentença, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, na parte em que efectuou a recusa acima aludida.

Apresentou alegações que concluiu do seguinte modo:

1. A norma do artigo 8.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Regime Geral das Infracções Fiscais, na interpretação que consagra uma responsabilização subsidiária dos administradores e gerentes pelo pagamento de coimas aplicadas à Sociedade, que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal, não viola os artigos 30º, nº 3 e 32º, nºs 2 e 10 da Constituição, não sendo, por isso, inconstitucional.

2. Termos em que deverá conceder-se provimento ao recurso.

A Recorrente apresentou contra-alegações em que concluiu pela improcedência do recurso.

Fundamentação

É objecto do presente recurso a interpretação normativa do artigo 8.º, do RGIT, com o sentido de que aí se consagra uma responsabilização subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora.

Esta secção do Tribunal Constitucional, no Acórdão n.º 481/2010, já se pronunciou no sentido de julgar inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, a norma do artigo 7.º-A, do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras (RJIFNA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 394/93, de 24 de Novembro), à qual sucedeu o artigo 8.º do RGIT, na parte em que se refere à responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes pelos montantes correspondentes às coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação fiscal.

A fundamentação exposta nesse aresto é transponível para a apreciação da constitucionalidade da interpretação normativa que o presente recurso tem como objecto, até porque o disposto no artigo 7.º A, do RJIFNA, foi encarado precisamente com o sentido que aqui foi recusado pela sentença recorrida, pelo que, remetendo-se para essa fundamentação, deve julgar-se inconstitucional a norma sob apreciação.

Decisão

Pelo exposto decide-se:

a) Julgar inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, a norma do artigo 8.º, do Regime Geral das Infracções Tributárias aprovado pela Lei 15/2001, de 5 de Junho, interpretado com o sentido de que aí se consagra uma responsabilização subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão da execução fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora.

b) Consequentemente, negar provimento ao recurso.

Sem custas.

Lisboa, 12 de Janeiro de 2011.- João Cura Mariano – Joaquim de Sousa Ribeiro – Catarina Sarmento e Castro – Rui Manuel Moura Ramos. Voto a decisão, nos termos da fundamentação anexa.

DECLARAÇÃO DE VOTO

1. Em causa no presente processo está a norma do artigo 8º do RGIT “quando interpretado no sentido de que aí se consagra uma responsabilidade subsidiária pelas coimas que se efectiva através do mecanismo da reversão fiscal contra os gerentes e administradores da sociedade devedora”.

No acórdão nº 481/2010, desta secção, dissentimos do juízo de inconstitucionalidade formulado em relação à norma (idêntica à actualmente em apreciação) contida no artigo 7º do RJIFNA, uma vez que não perfilhávamos a construção, acolhida nesse acórdão, de que a responsabilidade prevista nessa disposição não podia revestir-se de natureza civil. Entendemos com efeito que não está vedado ao legislador responsabilizar civilmente os gerentes e administradores de uma sociedade por um comportamento próprio traduzido na causação culposa da situação criadora da impossibilidade de satisfação do crédito emergente de uma coima imposta à sociedade em que tenham exercido responsabilidades de administração ou gestão. Mas antecipáramos já que poderiam não estar isentos de censura constitucional os termos de efectivação dessa responsabilidade (maxime através do mecanismo da reversão). Só que tínhamos para nós que a desconformidade constitucional não estaria na previsão daquele tipo de responsabilidade (resultante do artigo 7º do RJIFNA como do artigo 8º do RGIT), mas em algumas modalidades da sua efectivação, que àqueles preceitos não podiam ser directamente reconduzidas mas que implicavam a mobilização de outros locais do sistema.

2. A norma ora sub judice constitui precisamente uma exemplificação da hipótese que na altura configurámos. Na verdade, está agora em causa a dimensão normativa que prevê a efectivação da responsabilidade subsidiária, prevista naquelas disposições, dos gerentes e administradores da sociedade devedora, através do mecanismo da reversão, pelas coimas em que aquela haja sido condenada.

Assentando em que não é inconstitucional a responsabilização de gerentes e administradores pelo comportamento pessoal que, ao provocar a situação de incumprimento da sociedade, frustrou a cobrança coerciva do valor correspondente à coima, cumpre agora indagar se a efectivação daquela responsabilidade, pelo mecanismo da reversão, ao abrigo do artigo 160º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, será desconforme com os princípios constitucionais.

Parece-nos que a resposta afirmativa se impõe. Na verdade, o chamamento daqueles sujeitos à execução faz-se por reversão desta, baseada no título executivo que serviu para a instauração da execução contra a sociedade. Não comportando tal título a responsabilização dos administradores e gerentes pelo comportamento pessoal que terá conduzido à diminuição patrimonial da sociedade que a impossibilitou de pagar as coimas, o prosseguimento da execução, nele baseada, contra aquelas entidades envolve uma execução sem título, que, ao implicar a mobilização do poder coercitivo do Estado contra sujeitos de direito cuja responsabilidade se não acha estabelecida, configura uma violação do princípio do processo equitativo previsto no artigo 20º, nº 1, da Constituição e, em particular, das dimensões de audiência e defesa que lhe são naturalmente inerentes.

3. Note-se que o que acima fica dito não implica a desconformidade constitucional do mecanismo da reversão da execução previsto no artigo 160º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, mas apenas a da sua utilização fora do âmbito das execuções fiscais. Aqui, com efeito, os responsáveis subsidiários são chamados a responder pela dívida dos devedores originários, uma vez que, ao serem igualmente sujeitos tributários, por opção legal, estão também adstritos ao cumprimento daquela obrigação.

Enquanto redirecciona a cobrança da dívida tributária no interior do círculo dos obrigados ao seu cumprimento, o mecanismo da reversão limita-se a constituir uma opção ditada pelas exigências da economia processual, por isso dentro da margem de disponibilidade do legislador. Diversamente, quando utilizada para promover a execução para além do título que lhe serve originariamente de base, a reversão não pode deixar de conduzir a uma execução sem título, configurando uma manifesta violação do princípio do processo equitativo e em particular do direito de audiência e defesa incluídos no respectivo núcleo essencial.

4. Nestes termos, implicando a dimensão normativa em apreciação uma execução correspondente à efectivação de uma alegada responsabilidade, não titulada, e em qualquer caso de natureza distinta da dívida que é objecto do título revertido, entendi que ela implica uma violação do princípio do processo equitativo e do direito de audiência e defesa, o que me levou a acompanhar, com esta distinta fundamentação, a decisão a que o Tribunal chegou no presente processo.- Rui Manuel Moura Ramos.

quinta-feira, outubro 13, 2011

Criação de Núcleo de Representantes da Fazenda Pública

Nas medidas acordadas no Programa de Apoio Económico e Financeiro a
Portugal, prevê-se a resolução até Janeiro de 2012 dos processos judiciais de
natureza tributária de valor superior a € 1 milhão, encontrando-se nestas
circunstâncias, de acordo com apuramento feito junto dos Tribunais Superiores
e Administrativos e Fiscais, 1 328 processos que, no seu conjunto,
representam um valor na ordem dos 7,2 mil milhões de euros.
A Administração Tributária intervém nestes processos através dos respectivos
representantes distritais, competindo-lhe, designadamente, apresentar a
contestação, recorrer das decisões e praticar quaisquer outros actos previstos
na lei.
Neste âmbito, por indicação do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos
Fiscais, e sem prejuízo da competência estabelecida no artigo 54.º do Estatuto
dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19
de Fevereiro, foi criado, na dependência dos Serviços Centrais da DGCI com
competência nesta matéria, um Núcleo de Representantes da Fazenda Pública
com a missão específica de intervir, acompanhar e monitorizar os processos
judiciais de natureza tributária de valor superior a € 1 milhão,
independentemente da localização territorial do processo.
Lisboa, 2 de Setembro de 2011.
Comunicado disponível em www.min-financas.pt

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