segunda-feira, abril 09, 2007

Prescrição do Procedimento Criminal por Fraude Fiscal

Nos termos do artigo art. 21.º Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), o procedimento criminal por crime tributário extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática sejam decorridos cinco anos.
Todavia, o n.º 3 do mesmo artigo estabelece que o prazo de prescrição do procedimento criminal é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação.
Ora, nos termos do artigo 45.º da Lei Geral Tributária (LGT) o direito de liquidar tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos.
Estes prazos de caducidade contam-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu.
Do que vem dito poderia resultar que estaria igualmente prescrito o procedimento criminal, por se encontrar ultrapassado o prazo de caducidade da liquidação, dado que, como dissemos supra, o prazo de prescrição do procedimento criminal é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação.
Vejamos.
A infracção depende da liquidação da prestação tributária sempre que a determinação do tipo de infracção ou da sanção aplicável depender do valor daquela prestação, uma vez que a liquidação é o meio de determinar este valor.
O tipo legal de crime de fraude fiscal inclui determinadas condutas dolosa visando a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária.
Portanto, o momento a partir do qual começa a contar o prazo de prescrição é o momento da acção delituosa, com vista ao não pagamento da prestação tributária.
Estatui o artigo 103.º RGIT que:
«1. Constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias.
A fraude fiscal pode ter lugar por:
a) Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal específicamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável;
b) Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam se revelados à administração tributária;
c) Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.
2. Os factos previstos nos números anteriores não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a € 7500.
3. Para efeitos dos disposto nos números anteriores os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária


Ou seja, constituem fraude fiscal as condutas tipificadas nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do art. 103º do RGIT que sejam pré-ordenadas à não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou à obtenção de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição de receitas tributárias.
Por exemplo, aquando da celebração de negócio simulado quanto ao preço, quer o vendedor, quer o comprador, saem fiscalmente beneficiados. O vendedor porque omite matéria tributável, o comprador porque, declarando um preço inferior, paga menos imposto sobre a transacção.
Importará esclarecer qual o momento da consumação do crime.
A ocultação de factos ou valores é apenas um dos elementos do crime de fraude fiscal, que não se esgota nessa actuação.
De resto, tal ocultação poderá não coincidir – e em regra não coincide - com a recusa de exibição de elementos de escrita à administração fiscal em sede de acção de fiscalização.
Tal recusa nesse momento não constituirá, normalmente, o elemento ocultação, mas mero indício da sua verificação, e isto porque a ocultação enquanto elemento constitutivo do crime não tem lugar no momento da fiscalização, mas sim no momento em que os factos ocultados deveriam ter sido revelados à administração fiscal e não o foram.
É o que resulta, aliás, do nº 2 do art. 5º do RGIT:
«As infracções tributárias omissivas consideram-se praticadas na data em que termine o prazo para o cumprimento dos respectivos deveres tributários.»
Na verdade, e face ao disposto no art. 5º, nº 2, do RGIT e à luz do art. 112º, nº 1, do CIRC, o crime da alínea a) do art. 103º do RGIT, enquanto reportado à ocultação de factos ou valores que deveriam ter constado da declaração de rendimentos consumou-se na data em que terminou o prazo para o cumprimento desse dever tributário de natureza formal.
Como vimos, dispõe o nº 1 do art. 45º da LGT:
«O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for válidamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.»
Quanto à contagem do prazo, dispõe o nº 4:
«O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (…)»
E o art. 21º do RGIT dispõe, no seu nº 3, que:
«O prazo de prescrição do procedimento criminal é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infracção depender daquela liquidação.»
No exemplo apontado supra (celebração de negócio simulado quanto ao preço) poderemos estar perante a caducidade de liquidação de IRC (vendedor) e IMT (comprador).

Todavia, esta constatação não colide com a verificação do crime de fraude fiscal, nem com o respectivo prazo de prescrição.
Na verdade, as normas supra citadas regem sobre o prazo de caducidade do direito de liquidar impostos periódicos e sobre a prescrição do procedimento criminal relativamente a infracções que dependam dessa liquidação.
Não nos parece que seja esse o caso no crime de fraude fiscal.
Com efeito, a verificação do crime em causa, poe exemplo na esfera jurídica do vendedor, não depende da liquidação do IRC.
É que, tendo em consideração que o crime se consumou com a ocultação, no último dia do mês de cumprimento da obrigação declarativa, quanto a factos ou valores que ali deveriam ter constado - por ser aquela a data em que terminou o prazo para o cumprimento do correspondente dever tributário - tal supõe necessariamente a inexistência de liquidação na data da consumação do crime, pois os factos ocultados à administração fiscal são precisamente aqueles que seriam usados para a liquidação.
Ou seja, no caso em apreço, a verificação do crime não só não depende da liquidação como necessariamente a precede.
Aliás, a admitir-se que a verificação do crime dependeria da liquidação do imposto, levar-nos-ia necessariamente à conclusão de que, na medida em que ainda não houve liquidação, o crime ainda se não teria consumado.

Essencial, pois, face ao disposto no art. 103º, nº 2, do RGIT, não é a liquidação - que poderá até nem existir - mas a determinação da vantagem patrimonial ilegítima, a qual deverá ser igual ou superior a 15.000 euros.

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