segunda-feira, maio 17, 2010

Não retroactividade das mais valias mobiliárias

Na sequência da comunicação, por parte do Governo, em proceder à tributação das mais-valias mobiliárias realizadas desde 01 de Janeiro do corrente ano, um conjunto de reputados fiscalistas juntou-se num manifesto elaborado nos seguintes moldes:

«Manifesto por uma tributação não-retroactiva das mais-valias mobiliárias: necessidade de um regime transitório

1. Foi aprovado na passada quinta-feira, em Conselho de Ministros, um novo regime de tributação em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) das mais-valias mobiliárias. Com este regime elevar-se-á para 20% a taxa de imposto na alienação de acções detidas por menos de 12 meses, eliminar-se-ão as exclusões consagradas anteriormente para as mais-valias geradas com a alienação de acções detidas por mais de 12 meses e obrigações e outros títulos de dívida e aumentar-se-á ainda a tributação das quotas e de outros valores mobiliários, anteriormente de 10%. Esta medida tem sido caracterizada na comunicação social como atingindo as mais-valias "bolsistas", mas ela onera desde a venda de acções não cotadas em bolsa, passando por obrigações da dívida pública ou privada, até às quotas numa qualquer sociedade.
2. Parece existir, hoje, um consenso inédito da maioria dos partidos com assento parlamentar, no sentido de tributar as mais-valias mobiliárias. Independentemente de se aceitarem, ou não, as invocadas razões de justiça contributiva ou a necessidade de receita fiscal, importa atentar no "quando" e no "como" da sua introdução.
3. O regime actual de tributação de mais-valias obtidas na transmissão onerosa de quotas, acções, obrigações e títulos de dívida vigora desde 1989. As mais-valias mobiliárias não eram genericamente tributadas em sede do anterior Código do Imposto de Mais-Valias. Assim, o diploma que aprovou o Código do IRS dispôs que só ficariam sujeitas a este imposto as partes sociais adquiridas depois da sua entrada em vigor, solução que protegia as expectativas de quem havia adquirido partes de capital até 31 de Dezembro de 1988.
4. Foi posteriormente ensaiado, em 2000, pela denominada Lei da Reforma Fiscal, um agravamento da tributação sobre a matéria. Nessa Lei, aprovada pelo PS, PCP e BE, previa-se um englobamento parcial e uma tributação progressiva das mais-valias mobiliárias, mas a nova redacção do Código do IRS era também apenas aplicável às partes sociais e outros valores adquiridos após a sua entrada em vigor.
5. A fazer fé no Comunicado de quinta-feira da Presidência do Conselho de Ministros e na posição pública posteriormente assumida pelo Ministro das Finanças, a Proposta de Lei que terá sido aprovada no Conselho de Ministros não inclui regime transitório. Assim, e por omissão, poderá pretender-se a tributação das mais-valias mobiliárias realizadas desde 1 de Janeiro. Ou seja, aquilo que não foi introduzido em Janeiro, Fevereiro ou Março para o ano de 2010, poderá, agora, aplicar-se para esses mesmos meses. Ora, não é juridicamente irrelevante introduzir tributação anual em IRS no dia 1 de Janeiro ou em Junho ou Julho (meses da provável publicação da lei ora em causa), ou, no limite, no dia 31 de Dezembro.
6. Esta tributação, pelo menos na parte em que atinja quem alienou acções, quotas, obrigações ou outros títulos de dívida antes da publicação e entrada em vigor da lei nova, é, ou pode ser, na opinião dos subscritores, inconstitucional, por violação dos princípios da segurança jurídica e da não retroactividade da lei fiscal.
Ela afecta quem confiou no regime em vigor para decidir se vendia ou comprava e por que preços o fazia, o que porventura não teria feito, ou feito nas mesmas condições, acaso conhecesse a tributação que, agora, e se assim for, impenderá sobre ganhos passados.
7. A Lei, acaso publicada por exemplo em Maio, Junho ou Julho de 2010, já poderá não violar a Constituição, se se vier a aplicar, apenas, às mais-valias realizadas após a data da sua publicação e entrada em vigor, ainda que, por essa via, possa atingir títulos ou quotas adquiridos anteriormente. Mas, ainda assim, a tutela da confiança aconselharia a seguir os precedentes de 1989 e 2000, os quais salvaguardaram as expectativas de todos quantos já tinham mais-valias potenciais ou latentes em bens previamente adquiridos.

Lisboa, 26 de Abril de 2010

Os subscritores iniciais,
1. Afonso Machado Arnaldo, Consultor Fiscal
2. Américo Coelho, Consultor Fiscal
3. André Machado Vaz, Revisor Oficial de Contas e Consultor Fiscal
4. António Beja Neves, Consultor Fiscal
5. António Calisto Pato, Consultor Fiscal
6. António Fernandes de Oliveira, Advogado
7. António Lobo Xavier, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
8. António Maria Pimenta, Advogado
9. António Neto Alves, Advogado
10. António Neves, Consultor Fiscal
11. António Paula Varela, Advogado
12. António Pedro Braga, Advogado
13. António Rocha Mendes, Advogado
14. Bruno Botelho Antunes
15. Cândida Peixoto, Consultora Fiscal
16. Carlos Loureiro, Consultor Fiscal e Docente Universitário
17. Diogo Ortigão Ramos, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
18. Eduardo Goldszal, Consultora Fiscal
19. Fernando Brás, Revisor Oficial de Contas e Consultor Fiscal
20. Fernando Carreira Araújo, Revisor Oficial de Contas
21. Fernando Castro Silva, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
22. Filipe Miguel Nogueira, Consultor Fiscal
23. Filipe Romão, Advogado
24. Francisco de Sousa da Câmara, Advogado (Especialista em Direito Fiscal) e Docente Universitário
25. Gonçalo Bastos Lopes, Advogado
26. Gustavo Lopes Courinha, Advogado e Docente Universitário
27. Isabel Santos Fidalgo, Advogada
28. Jaime Carvalho Esteves, Consultor Fiscal
29. João Espanha, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
30. João Magalhães Ramalho, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
31. João Maricoto Monteiro, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
32. João Paulo Silva, Consultor Fiscal
33. João Sousa, Consultor Fiscal
34. João Velez de Lima, Advogado
35. John Duggan, Consultor Fiscal
36. Jorge Marrão, Docente Universitário
37. Jorge Tainha, Consultor Fiscal
38. José Novais, Consultor Fiscal
39. José Pedroso de Melo, Advogado
40. José Silva Jorge, Consultor Fiscal
41. Justino Romão, Revisor Oficial de Contas
42. Luís Belo, Consultor Fiscal
43. Luís Magalhães, Consultor Fiscal
44. Margarida Ramos Pereira, Consultora Fiscal
45. Maria Antónia Torres, Consultora Fiscal
46. Miguel C. Reis, Advogado
47. Miguel Leónidas Rocha, Consultor Fiscal
48. Miguel Torres, Advogado
49. Nuno Cunha Barnabé, Advogado
50. Nuno Pombo, Jurista e Docente Universitário
51. Nuno Sampayo Ribeiro, Advogado (Especialista em Direito Fiscal) e Docente Universitário
52. Paula Rosado Pereira, Advogada e Docente Universitária
53. Paulo Alexandre Gaspar, Revisor Oficial de Contas e Consultor Fiscal
54. Paulo Núncio, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)
55. Pedro Marques, Consultor Fiscal
56. Pedro Paiva, Consultor Fiscal e Revisor Oficial de Contas
57. Pedro Vidal Matos, Advogado
58. Ricardo da Palma Borges, Advogado (Especialista em Direito Fiscal) e Docente Universitário
59. Ricardo Reigada Pereira, Advogado
60. Ricardo Sá Fernandes, Advogado
61. Rogério Fernandes Ferreira, Advogado (Especialista em Direito Fiscal) e Docente Universitário
62. Rosa Maria Soares, Consultora Fiscal
63. Rui Camacho Palma, Advogado
64. Serena Cabrita Neto, Advogada (Especialista em Direito Fiscal) e Docente Universitária
65. Teresa Sofia Dias, Consultora Fiscal
66. Tiago Marreiros Moreira, Advogado (Especialista em Direito Fiscal)»

StatCount - Traffic counter